A Usucapião Administrativa


23/06/2016 às 10h42
Por Sérgio Rangel Advogado

Senhores colegas da profissão jurídica:
Trago para estudos e debates, o tema "A Usucapião Extrajudicial":

O NCPC, no Art. 1.071 acrescentou o artigo 216-A à lei 6.015\73 (Registros Públicos), introduzindo em nosso ordenamento jurídico a denominada usucapião administrativa, ou extrajudicial, disciplinando seu procedimento perante o Registro de Imóveis.

Tenho lido muitas publicações exaltando a "simplicidade" do procedimento, o desaforamento dos requerimentos de usucapião, etc., etc.

Sem pretender esgotar o tema, e com todas as venias a todas as opiniões, ao meu ver, a questão realmente não merece aplauso.

O legislador, notadamente, pretendeu desafogar o judiciário com esse procedimento, a exemplo do que já ocorre com os inventários e partilhas, separações ou divórcios, o que me parece louvável.

O procedimento administrativo, como disciplinado no Artigo 216-A da Lei registral exige praticamente todos os mecanismos probatórios necessários ao procedimento judicial, no entanto, o que destaco é a exigência contida no inciso II, que passou a exigir a apresentação de "planta e memorial descritivo assinado por profissional habilitado (engenheiro, arquiteto, agronomo, etc, conforme o caso) apresentando a ART (anotação de responsabilidade técnica), até aqui sem maiores problemas. Porém, passou a ser requisito de admissibilidade, também, que este documento contenha a assinatura de quem detenha direitos reais e outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula dos imóveis confinantes. Data venia, esse requisito me parece absurdo.

Prezados, em que pese as opiniões de elogios ao novo sistema, tenho que está fadada à impraticabilidade, isso porque, na maioria das vezes, arisco dizer 99%, quem requer usucapião é aquele que de alguma forma "adentrou" no imóvel (seja por um "justo título" ou arbitrariamente) e nele se instalou com animo de "dono", lá permanecendo por um determinado tempo, sendo factível perceber que não têm o conhecimento da titularidade registral ou quem tenha qualquer direito real, inobstante às certidões que possam ser obtidas. Tal fato obstará a coleta da assinatura desses indivíduos (e ademais, quem iria assinar, de bom grado, para transferir para alguém sua propriedade, pela via usucapienda?).

E mais, soma-se a isso o fato de que na falta dessas assinaturas, que não impede o requerimento administrativo, o registrador deverá intimá-los para manifestar sua concordância (§ 2º), sendo que o silêncio não importará em concordância tácita, pelo contrário, será tido como discordância, o que remete ao disposto no § 6º, que estabelece que decorridos os prazos, não havendo pendências e achando-se em ordem a documentação, com a inclusão da concordância expressa dos titulares de direitos reais e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula dos imóveis confinantes, o oficial de registro de imóveis registrará a aquisição do imóvel com as descrições apresentadas, sendo permitida a abertura de matrícula, se for o caso. Ora, a falta dessas concordâncias macularia o procedimento adminsitrativo levando o registrador a rejeitar o requerimento, como firma o § 8º, verbis: "ao final das diligências, se a documentação não estiver em ordem, o oficial de registro de imóveis rejeitará o pedido", fato que não impedirá o ajuizamento da ação de usucapião (§ 9º).

Além disso, no caso de impugnação ao pedido administrativo, o oficial do registro de imóveis deverá remeter os autos ao juizo competente da comarca da situação do imóvel, devendo o requerente "emendar a inicial adequando-a ao procedimento comum", e o que me pareceria mais útil, seria um deslocamento da competência, disciplinando-se um procedimento nesses casos, análogo ao da suscitação de dúvida, dirigida ao juiz da vara registral.

Bem, o problema maior desse procedimento, então, reside no fato de que raramente o interessado logrará êxito em obter na planta e memorial, as assinaturas daqueles que detêm direitos reais e outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel, fato que não dará ordem à documentação necessária levando seu requerimento a rejeição, obrigando-o, então ao pleito judicial.

Por tais fundamentos, acredito que, embora nobre, tal procedimento não irá prosperar na prática, senão naqueles casos em que, não cabendo a adjudicação compulsória, houver algum impedimento documental que impeça o ato registral, ocasião em que comprador e vendedor se unirão para a regularização de sua transação por meio dessa modalidade de usucapião.

  • Artigo 1.071 - NCPC

Referências

Interpretação pessoal do procedimento da usucapião administrativa.


Sérgio Rangel Advogado

Bacharel em Direito - São Gonçalo, RJ


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