Resumo – O presente artigo visa analisar a ilegalidade da greve política estudando as mudanças ocorridas na Lei de Greve E a forma que é contextualizada hoje por meio da Lei 7.783/89, sua aplicação no ordenamento jurídico brasileiro à luz do direito à greve garantido pela Constituição federal para ESCLARECER sua ilegalidade, tendo em vista as diferentes posições doutrinárias hoje adotadas, identificando a predominante, bem como a descrição do entendimento jurisprudencial. O objetivo deste estudo é analisar a ilegalidade da greve política e em que ela se baseia. Utilizou-se como metodologia a pesquisa bibliográfica, análise de doutrina jurídica na área trabalhista bem como análise jurisprudencial. Como resultados verificou-se que muitas mudanças já ocorreram no direito à greve, inclusive que já fora considerado ato ilícito e hoje é direito garantido pela Constituição. Diante desses contrapontos concluiu-se que mesmo com as mudanças sendo significativas, ainda assim esse direito a greve não é irrestrito e conta com a legislação infraconstitucional específica para delimitar os interesses legítimos e regular o referido direito.
Palavras-chave: Direito de Greve, Greve política, Ilegalidade.
Área do Conhecimento: Direito do Trabalho
Introdução
A greve como bem definido pela legislação e doutrina, é o meio pelo qual os trabalhadores podem reivindicar direitos, em geral, visando melhorias nas condições de trabalho, o que via de regra é uma das medidas a serem tomadas frente a uma situação de irredutibilidade por parte dos empregadores, pois são reivindicações que vão contra os interesses desses, as vezes até pela impossibilidade de atendê-los.
Vê-se a tamanha importância concedida ao direito de greve no nosso ordenamento, pois é hoje garantido pela Constituição em seu artigo 9º, porém em sua atual redação escrita de forma ampla, impulsiona os trabalhadores a decidir sobre a oportunidade de exerce-lo e sobre os interesses que desejarem defender, tal abrangência de adequação à greve, faz nascer no âmbito social o equivocado conceito de que todo e qualquer assunto é passível de paralisação à luz da Constituição, no entanto, tal direito tem suas restrições e regulamentações previstas em legislação específica infraconstitucional dada pela Lei 7.783/1989. Veremos que essa lei, traz em sua redação os limites da greve trabalhista e sua redação expressa a legalidade nas ações grevistas, considerando legítimo o poder de greve sob interesses pertinentes a relação laboral.
Ocorre que apesar de expressamente prevista a delimitação de que tipo de interesse é considerado legítimo ao direito à greve na legislação que especifica este tema, devido ao texto constitucional supra citado, há, entre doutrinadores e sociólogos, uma divergência sobre o assunto greve em seu sentido jurídico e social, bem como os interesses pertinentes a legalidade desse exercício constitucional, que faz com que muitos entendam que a greve trabalhista para defesa de interesses políticos ou partidários seja legítima e legal, o que não se vislumbra analisando a legislação positivamente.
Pretende-se com este trabalho analisar as diferentes ideias de grandes doutrinadores que posicionam-se de maneiras opostas e dispor de tais entendimentos fronte a atual legislação, interpretando a constituição de forma conjunta com a legislação especial para assim estabelecer de forma objetiva o posicionamento atualmente adotado por nossos tribunais e pela doutrina majoritária no sentido de considerar a chamada: “greve política” ilegal. Alcançando essa trilha, teremos como vislumbrar uma base científica que nos leva ao vislumbre de uma segurança jurídica trazida por esse entendimento.
Metodologia
Este artigo foi elaborado metodologicamente sob análise de doutrina da área trabalhista direcionada à lei de greve no direito do trabalho, versando sobre sociologia para se fazer entender a natureza da greve no nosso país, com a pesquisa direcionadas a legislação atual em vigor e sobretudo artigos científicos relacionados ao tema com diferentes posicionamentos.
Resultados
Objetiva-se, com esse estudo, analisar e expor a legislação que regulamenta o direito de greve no direito trabalhista, descrevendo suas considerações gerais, para então esclarecer de forma breve, a explanação da natureza jurídica da greve, o que tem relação direta com sua evolução histórica. Pretende-se realizar um estudo expondo as divergências doutrinárias quanto a legalidade da greve política e seus fundamentos para então discutir sua real eficácia no que pese o objetivo que se funda o referido direito e os motivos que tornam a greve política, incabível para o direito trabalhista.
Isto pois, o direito à greve já sofreu diversas mudanças no nosso ordenamento jurídico, tendo sido a forma de lutar por direitos trabalhistas desde antes de Cristo, por volta do século XII a.C., no Antigo Egito, já se tem registros de luta pelos direitos laborais, quando trabalhadores se recusaram a trabalhar porque não receberam o que lhes fora prometido, os denominados “pernas cruzadas” (DELGADO, 2010).
Sendo assim, desde que se tem registro, muitas foram as tentativas de valer-se da greve para exigir fenecias e melhores condições, tendo os grevistas, sofrido represarias e punições em diversos momentos da história, em diversos países, o que não foi em vão, pois o animus da greve só foi se alastrando. Contudo, um grande marco no ganho de maior percepção do direito grevista mundial se deu com a Revolução Industrial. Em 1831, em Lyon, deu-se a primeira grande greve na França, de um lado, os empregados, exigindo que fosse atribuído aos salários força obrigatória jurídica, e de outro os fabricantes, que recusavam-se a atribuir tal cunho obrigacional e desejavam que fosse mantida a obrigatoriedade meramente moral. Assim, iniciou-se com maior expressão até os dias de hoje a greve como finalidade social (ALMEIDA, 2010).
Essa greve social não se confunde com a política entretanto, pois o interesse apesar de social tem intima relação com o contrato de trabalho entre empregado e empregador, não sentido portanto interesse estritamente político. Com os diferentes entendimentos ao redor do mundo, deu-se diversas reações jurídicas aos movimentos grevistas, tendo países que toleravam tal movimento, como o caso da Inglaterra, alguns tipificaram penalmente como ato delituoso, e ainda, os que regulamentaram tal movimento como
direito.
O Brasil por sua vez, no Código Penal de 1890 expressamente proibia a greve, posteriormente contou com a força maior da Constituição de 1934 que igualmente impedia a prática, seguida pela Constituição de 1937, foi em seu artigo 139 considerada um recurso antissocial e nocivo à segurança nacional, e teve o código penal que o seguiu legislando a greve da mesma maneira, com a promulgação da Consolidação das Leis do Trabalho em 1943, além da previsão constitucional e penal, a Consolidação previa em seu artigo 723 sanções aos trabalhadores que ousassem aderir este tipo de ato, em 1946, com a Lei 907/46, este artigo foi revogado, e a lei passou a permitir tais atos
com limitações, a Constituição de 1946, inaugurou a lei de greve, permitindo a pratica em seu artigo 158, contudo somente para atividades acessórias, a redação da Constituição que a seguiu, 1967 manteve a mesma redação. Contudo as referidas limitações nunca foram obedecidas pelos sindicatos, como pode-se ver nas inúmeras grandes greves que a história do nosso país não esconde, onde os requisitos legais por vezes não eram obedecidos mostrando que as limitações legais não foram capazes de evitar a busca incansável por mais direitos trabalhistas.
Desta forma passou a vigorar a Constituição Federal de 1988, que assegura o direito a greve, diminuindo os limites previstos anteriormente, determinando a criação de lei específica para vigorar a greve de atividades consideradas essenciais e prevendo punições aos abusos, deixando claro que não se trata de direito absoluto, sendo suscetíveis à ordem jurídica.
Contudo, na redação contida na atual constituição é previsto em seu caput que é assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender, e tendo sido abrangente desta forma, torna a interpretação suscetível à conveniência do leitor e consideraria legítima toda e qualquer greve independente do motivo que levassem os trabalhadores a cruzar os braços.
Foi nesse canário que, no ano seguinte passou a vigorar a Lei 7.783/89, conhecida hoje como Lei de Greve, dizimando qualquer entendimento diverso, a lei regulamenta o poder de greve e desmarcara as possibilidade de interesses válidos para a prática legítima de tal direito no âmbito trabalhista. No seu artigo 2º, a Lei 7.783/89 dispõe da definição à greve como sendo “a suspensão coletiva, temporária e pacífica total ou parcial, de prestação pessoal de serviços ao empregador“.
Interpretando sistematicamente o referido artigo, o professor Maurício Goldinho Delgado ensina que a greve, é a paralisação coletiva provisória, parcial ou total, das atividades dos trabalhadores em face de seus empregadores ou tomadores de serviços, com o objetivo de exercer-lhes pressão, visando à defesa ou conquista de interesses coletivos, ou com objetivos sociais mais amplos (DELGADO, 2010, p.149).
Cabe contudo, esclarecer, que a greve política não se classifica no que o professor Goldinho descreve como “objetivos sociais mais amplos”, esses objetivos sociais mais amplos seriam exatamente o caso da greve social que ocorreu em Lyon, França em 1831, descrito anteriormente. A greve política, é aquela que tem caráter estritamente político, não possui nenhuma base profissional visando protestar contra atos ou omissões dos governantes, do governo como um todo ou de atos do poder público, com objetivo não de obter diretamente melhorias nas condições de trabalho, no qual se exige do empregador, mas exigir que órgãos governamentais tomem ou deixem
de tomar determinadas atitudes, como foi o caso da recente greve contra a reforma trabalhista.(DELGADO, 2012, p.1429)
Desta forma, a greve com interesses políticos que busca uma ação ou omissão do governo tornaria a relação contratual trabalhista desequilibrada, dando a uma das partes poderes de paralização independente da ação da outra parte, isto é, o trabalhador estaria coberto pelas prerrogativas da greve, independentemente de ser os interesses ligados ou não a algo que o empregador possa resolver. Não podendo nada fazer o empregador para que sanasse o estado inerte de paralização de seus empregados arcando apenas com o ônus de ter sua mão de obra parada sendo vetado a contratação de trabalhadores substitutos para suprir a eventual necessidade e sequer podendo atender as solicitações dos grevistas, um vez que as reivindicações estão fora de seu alcance.
Discussão
Essa concepção de greve política como forma legítima de se pleitear direitos políticos ou atitudes governamentais é defendida pela minoria dos doutrinadores, indo contra o posicionamento inclusive jurisprudencial do nosso ordenamento jurídico, Esses defensores sustentam que o fato de uma greve ser instituída com base em uma reivindicação estritamente política não pode servir de motivação para caracterizar sua ilegalidade ou abusividade. Essa linha de pensamento é chamada de teoria ampliativa. O principal argumento desses teóricos é que não há nenhuma limitação legal à greve política, vez que a Constituição Federal, no seu Artigo 9º, é bem ampla e não especifica o interesse
deixando a cargo do trabalhador decidir os interesses que serão a base da sua reivindicação. Assim sendo, e não havendo a proibição de nenhum tipo, entende-se a licitude de tal atitude.
Tal argumento no entanto torna-se frágil considerando que despreza totalmente a legislação específica para tal direito, o que se vê é que o legislador ao utilizar o termos “trabalhadores” vislumbra apenas relações de trabalho, não prevendo possibilidades de greves políticas. Para esse argumento, discute-se que os defensores alegando ser essa interpretação uma forma involutiva, “em que se cria, por meio do falso exercício hermenêutico, o sentido da demolição de direitos que a própria Constituição vinha conflagrando e prestigiando” (CORREIA, 2007, p. 29).
O limite é posto justamente pelo texto da Lei de Greve 7.783/89 que esclareces requisitos básicos para que se instaure uma greve, sendo um deles, previsto no art. 3ºque é a negociação ou tentativa arbitral, depois o art.4º prevendo a Convocação de Assembleia Geral para definir as reivindicações da categoria e deliberar sobre a paralisação, Art. 3 parágrafo único: Aviso ao empregador com pelo menos 48 horas de antecedência. Não atendidos aos requisitos ou mantendo a manutenção da paralisação após fechado o acordo, convenção coletiva ou decisão judicial é considerado abuso do direito de greve.
Sendo portanto a greve política uma forma de abuso do direito de greve por não atender ao requisito que condiciona a greve à uma prévia tentativa de negociação, e não pode o empregador representar o estado em uma negociação, restando prejudicada uma negociação de causas políticas e da mesma forma toda a movimentação grevista.
Outro argumento bastante apoiado, aborda ao que os defensores da greve política chamam de finalidade da greve, que seria segundo eles a busca por melhores condições sociais. A greve, como um meio constitucionalmente garantido de manifestação dos trabalhadores, tem como uma das suas funções a busca de uma igualdade substancial dentro da sociedade já que não haveria separação entre economia e política nem entre Estado e sociedade civil (EDELMAN,1976).
Porém, analisando positivamente, não se pode confundir o direito de greve juridicamente tutelado pelo Direito do Trabalho, com o direito a livre manifestação garantido pela Constituição Federal, talvez seja o grande divisor de posicionamentos, visto que os defensores da greve política por vezes utilizam-se do termo “manifestação” dos trabalhadores para fins sociais, o que não se confunde com o de greve, manifestação não lhe permite prejudicar o empregador, e o trabalhador pode exercer seu
direito de manifestação, no âmbito civilista, e não à luz do direito de greve.
Para ter a exata sensibilidade de discernir o que é greve estritamente política, que é considerada abusiva, tem-se visto na jurisprudência o contrato de trabalho como a ferramenta de parâmetro, como vemos nos seguintes julgados: "O movimento de paralisação dos serviços qualificados no artigo 9º da Constituição Federal tem de estar vinculado à reivindicação contida no contrato de trabalho. Esta é a materialidade necessária, para que se possa falar em greve. Se a paralisação dos serviços ocorreu por motivação política, a "greve", por mais justa que possa parecer, deve ser considerada materialmente abusiva’’. (AC SDC 00052/20079 PROC 20258200600002005 Nelson Nazar Relator. DJ/SP de 02/04/2007 – TRT2).
Apesar das diferentes posições, sustentadas por diferentes argumentos, tem sido adotado a ilegalidade da greve política, predominantemente na doutrina, bem como na jurisprudência, sendo o Direito uma área que vem caminhando com a sociedade em constante evolução e possibilidades, a hermenêutica se faz necessário e as fontes do direito como bases sólidas trazem para o ordenamento a segurança jurídica na medida do possível.
Conclusão
O Direito à Greve na nossa história sofreu lenta mudança, porém, materialmente de grande importância, deixou de ser delito, passou a ser permitido com muita restrição, hoje é direito garantido, a uma importância de nível constitucional. Porém, a Constituição garantiu o direito à greve, e a Lei 7.783/89 regulamenta e limita, evitando assim os abusos.
Uma não pode ser lida e interpretada desprezando a outra, trata-se de Lei infraconstitucional que legisla matéria Constitucional, não cabendo portanto, interpretação apenas das três linhas que descreve a Constituição. No que diz respeito a greve política, há diferentes doutrinadores que propõem a legalidade neste tipo de greve, no entanto, à luz da lei que regulamenta a greve, viu-se que necessário se faz a interpretação de toda à norma pertinente ao assunto, e viu-se que assim vem sendo o entendimento jurisprudencial.
Atualmente, a greve política vem sendo discutida devido a movimentação da população no sentido de tentar pressionar o governo, uma causa que é justa no entanto não se pode confundir o legal com o conveniente, no âmbito trabalhista, restou esclarecido por meio das pesquisas realizadas e dos inúmeros materiais estudados que a greve de interesse estritamente político é ilegal e abusiva, como vem entendendo os tribunais, bem como a doutrina majoritária, sendo assim, pode-se verificar inclusive o olhar positivista que hoje adota nosso ordenamento jurídico. Inclusive, nota-se que tal posicionamento jurisprudencial e doutrinário se dá, não por conveniência, mas porque, desde a análise histórica do direito de greve no Brasil se vê o nítido descumprimento das legislações vigentes, neste sentido, ainda que a Constituição permitisse com poucas restrições o direito de greve, sem sancionar a legislação específica que atualmente vigora o que se veria, como foi visto durante vários anos na história do Brasil, seria um completo descaso com a moral e os bons costumes bem com um desrespeito às normas, não se importando com a situação complicada em que o empregador seria obrigado a se sujeitar.
Para garantir que esse tipo de conduta não se torne corriqueira no nosso convívio, o legislador e os demais juristas vêm trabalhado no sentido de coibir atitudes abusivas que possam por ventura lesar direito de outrem, o direito a greve quando usado de forma legítima pode ser uma ferramenta eficaz no controle da legalidade para com as partes da relação empregatícia, no entanto, deve-se buscar sempre o equilíbrio entre as relações do no Direito e por esse motivo vemos que hoje há uma clara posição da greve política como ilegal e abusiva.
A greve de fato é um importante direito adquirido pelo trabalhador ao longo do tempo, mas deve ser utilizado como um ferramenta jurídica do trabalhador em uma tentativa de equilibrar as forças na negociação trabalhista, não como uma arma para tentar controlar ou boicotar o governo.