Os Supermercados e os Entraves ao Direito de Crédito do ICMS na Aquisição de sacolas plásticas
A aquisição de sacolas plásticas, utilizadas pelos supermercados para acondicionamento e transporte de produtos pelo consumidor, tornou-se objeto de controvérsias em relação ao aproveitamento de credito do ICMS. E há inclusive decisões de tribunais que destacam a questão do impacto ambiental referente à utilização desse tipo de embalagem.
A glosa desses créditos pelos fiscos estaduais pode trazer muito desconforto a esses contribuintes, uma vez que já são onerados por uma carga tributária de peso considerável.
Frise-se que, ao surgirem questionamentos sobre o direito ou não a crédito fiscal referente à entrada de insumos, mister se faz estabelecer a distinção entre insumo e material de uso/consumo, dado que, conforme as normas do ICMS, dão direito ao crédito fiscal os insumos que estão adstritos à atividade comercial das empresas, ou, no caso de estabelecimentos industriais, rurais e prestadores de serviços, aqueles que são empregados no processo de produção industrial, rural ou na execução da prestação de serviço sujeita ao imposto.
Todavia, observa-se que as administrações fazendárias são refratárias à admissibilidade do crédito sob análise, pois consideram que as sacolas plásticas oferecidas aos clientes são materiais de uso/consumo desses estabelecimentos e não se constituem como insumos intrínsecos ao ato de comercialização, permitindo, no entanto, apenas o aproveitamento do crédito relativo às embalagens plásticas que servem para acondicionamento de produtos alimentícios, entre outros.
A nosso ver, essa postura é dissonante dos preceitos constitucionais, frente ao princípio da não-cumulatividade inerente ao ICMS, bem como legais. Aliás, o artigo 20, da LC 87/96, que trata das regras gerais do ICMS, dispõe que somente os bens alheios à atividade do estabelecimento não dão direito a crédito.
Reforçando o que dispõe a LC 87/96, o conceito de bem de uso/consumo concebido pelas legislações dos estados e legislação federal, diz respeito à mercadoria que não é utilizada na comercialização ou a que não for empregada para integração no produto ou para consumo no respectivo processo de industrialização ou produção rural, ou, ainda, na prestação de serviço sujeita ao imposto. Portanto, são aqueles bens utilizados ou consumidos pelo próprio estabelecimento em sua área administrativa, exemplificadamente: material de escritório (papel, caneta, lápis, etc.); material de limpeza (detergente, esponja, vassoura, etc.), bens para manutenção; máquinas, equipamentos, utensílios. Resumidamente, pode-se afirmar que são bens, direta ou indiretamente, alheios à atividade - fim do estabelecimento.
Ora, se são produtos relacionados diretamente ao uso na área comercial da empresa, e não usados ou consumidos na área administrativa, dúvidas não pairam sobre a licitude do aproveitamento do crédito. Todavia, observa-se, ao ser consultada a jurisprudência do STF e STJ, que não há notícia de decisão mais atual pro contribuinte relativa a essa matéria, e os Órgãos Máximos do Poder Judiciário criam ainda óbices formais para julgar o mérito de recursos interpostos pelos contribuintes, conforme se infere dos julgados que seguem:
RE 94.120-7 – AL (Acórdão Unânime da 2ª Turma do STF, DJ 12.11.1982)
O uso de sacos e sacolas gratuitamente fornecidos por estabelecimentos comerciais a seus fregueses, não autoriza o crédito de ICM, nas operações subseqüentes.
A decisão em tela considerou que as sacolas não se destinavam à revenda, não compunham o preço da mercadoria vendida, eram dadas gratuitamente para acondicionamento e transporte de mercadorias já acondicionadas para a venda, e que poderiam ser vendidas sem as sacolas. Segundo o entendimento firmado, seriam material de propaganda do estabelecimento, as quais não se incorporavam à circulação jurídica ou econômica sobre a qual incide o imposto.
Vejamos, também, a posição do STJ no AgRg no Ag 1342455/BA, 2a TURMA, DJe 14/12/2010.
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇAO DOS ARTS. 458 E 535 DO CPC. INEXISTENTE. ICMS. SACOLAS PLÁSTICAS. DIREITO DE CREDITAMENTO. PRINCÍPIO DA NAO CUMULATIVIDADE. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. ANÁLISE DE LEI LOCAL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 280/STF.
1. De início, a recorrente alega violação ao 458 e 535 do CPC, visto que ausente a motivação nas razões do acórdão, bem como estaria omisso. Contudo, "se os fundamentos do acórdão recorrido não se mostram suficientes ou corretos na opinião do recorrente, não quer dizer que eles não existam. Não se pode confundir ausência de motivação com fundamentação contrária aos interesses da parte " (AgRg no Ag 56.745/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJ de 12.12.1994).
2. Verifica-se que a prestação jurisdicional foi dada na medida da pretensão deduzida, como se depreende da leitura do acórdão recorrido, que enfrentou os temas abordados no recurso de apelação.
3. As razões recursais envolvem tema de índole eminentemente constitucional, qual seja, princípio da não cumulatividade, previsto no art. 155, II, 2º, da CF, o que torna inviável sua apreciação por esta Corte, conforme se extrai dos fundamentos que dão suporte ao acórdão recorrido.
4. Verifica-se que, embora a recorrente alegue ter ocorrido violação de matéria infraconstitucional, segundo se observa dos fundamentos que serviram de base para a Corte de origem apreciar a controvérsia acerca da incidência do ICMS sobre as sacolas, o tema foi dirimido no âmbito local (Lei Estadual n. 6.763/75; Decreto Estadual n. 43080/2002 e RICMS/2002), de modo a afastar a competência desta Corte Superior de Justiça para o deslinde do desiderato contido no recurso especial. Incidência da Súmula 280/STF (grifos nossos).
Agravo regimental improvido.
Negou-se provimento ao agravo regimental interposto pela DMA Distribuidora S/A, cujo objetivo era dar seguimento ao recurso extraordinário interposto contra o Estado de Minas Gerais. O STJ não se manifestou sobre o direito ou vedação ao creditamento, alegando tratar-se de matéria constitucional não sujeita à sua competência.
Em 2010, o STJ, porém, pronunciou-se, sustentando que, se os bens são efetivamente aplicados e consumidos na atividade-fim da empresa, deve-se reconhecer o direito à apropriação do crédito, nos termos do art. 20 da LC 87/96, ainda que esses bens não integrem o produto final (consoante a decisão exarada no REsp nº. 1175.166/MG, DJe 26/03/2010, 2ª Turma).
Pelo que se pode depreender, é aconselhável adotar uma postura mais conservadora, no presente momento, evitando-se a apropriação de tais créditos, a fim de evitar prováveis embaraços com a Fiscalização, bem como deixar para se discutir a matéria em momento mais oportuno, ou seja, em que a jurisprudência (espera-se) possa estar inclinada de modo mais favorável aos contribuintes do segmento supermercadista.