Resumo: O presente artigo visa de forma objetiva analisar o registro das sociedades empresárias no Sistema Nacional de Registro de Empresas (SINREM) de acordo com a legislação, jurisprudência e doutrina atual, demonstrando suas peculiaridades e diferenciando do Registro Civil das Pessoas Jurídicas (RCPJ).
Palavras chave: direito societário. sociedade empresaria. sociedade simples. registro de empresas.
Abstract: The following paper will objectively to analyze the registry of business companies in the National System of business companies’ registration (SINREM) according to the current legislation, jurisprudence and doctrine, demonstrating its peculiarities and differentiating of the civil registry of legal entities (RCPJ)
Keywords: corporate law. non-business companies. no business companies. companies’ registration.
Sumário: Introdução. 1. Pessoa jurídica. 2. Autonomia patrimonial. 3. Sociedades: simples e empresaria. 4. Registro da sociedade empresaria. 5. Registro das sociedades simples. 6. Ausência de registro. 7. Registro em local inadequado. Referências bibliográficas. Notas.
Introdução
O ser humano é um ser gregário por natureza, busca desta forma se tornar mais forte para consecução de certos objetivos, como ensina a doutrina do sociólogo Machado Neto[1]. Neste sentido Caio Mario (2011, p. 247) citando o alemão Enneccerus-Kipp-Wolff se posiciona: “Em todos os povos a necessidade sugeriu uniões e instituições permanentes, para a obtenção de fins comuns, desde as de raio de ação mais amplo, com o Estado, o Município, a Igreja até as mais restritas como as associações particulares”.
Essa característica do ser humano de concentrar-se em grupos mostrou-se com o tempo necessidade de ser protegida e regulada pelo ordenamento jurídico. Assim, em apertada síntese, pelas mãos do direito criou-se outro tipo de pessoa, diferente da humana, a Pessoa Jurídica, que titulariza direitos e contrai obrigações, adquirindo patrimônio próprio. Neste sentido Carlos Gonçalves leciona: “Surge, assim, a necessidade de personalizar o grupo, para que possa proceder como uma unidade, participando do comércio jurídico com individualidade. (2012, p. 183)”.
Ao se criar regularmente uma Sociedade, isto é, obedecendo às regras legais para sua constituição, os sócios que ali aportam seus recursos e forças, criam um ente dotado de Personalidade Jurídica. Isto é, as Sociedades são entes que se estruturam na forma de uma Pessoa Jurídica e que desta forma titularizam direitos e contraem obrigações próprias, independentemente de seus sócios.
Desta forma podemos dizer que as Sociedades são agrupamentos de pessoas que juntas buscam atingir um fim comum que sozinhos não seriam capazes de alcançar ou pelo menos levariam maior tempo e esforço para alcançá-lo. É a busca por uma otimização com base na divisão de esforços entre os que às compõe, dividindo tarefas, aportando recursos e repartindo os resultados.
Formar uma sociedade, independente do objeto é, portanto, dividir responsabilidade no enfrentamento de um empreendimento que pode ou não dar certo. Assim, ao repartir o “peso” do empreendimento se incentiva o desenvolvimento de novas atividades.
1. Pessoa jurídica
Pessoas Jurídicas são entidades à qual o ordenamento outorga Personalidade para que possam realizar o fim que delas se espera. Podendo contrair obrigações e titulariza direitos na ordem jurídica como se pessoa fosse. Possui a nomenclatura de Pessoa Jurídica em nosso ordenamento jurídico embora no direito comparado encontremos outras denominações para nominar o mesmo ente, tais como: ente de existência ideal, pessoa moral, pessoa coletiva, entre outros. Neste sentido nos valemos do conceito cunhado pelo do professor César Fiuza: “São entidades criadas à realização de um fim e reconhecidas pela ordem jurídica como pessoas, sujeitos de direitos e deveres (2012, p.145)”.
Muitas são as teorias que explicam a natureza jurídica deste ente. Em breve síntese podemos citar duas correntes de pensamento.
A primeira corrente sobre a natureza da Pessoa Jurídica é a Corrente Negativista. Em verdade, esta corrente de pensamento já superada nega de qualquer forma a existência de um grupo de pessoas que possa adquirir unidade e Personalidade Jurídica própria diferente de seus componentes.
A segunda corrente de teorias sobre a natureza da Pessoa Jurídica é a Corrente Afirmativista, que se subdivide em outras subteorias, sendo duas as mais importantes: As teorias da ficção; e as teorias da Realidade.
Dentre as teorias da ficção destacam-se duas: teoria da ficção jurídica; e teoria da ficção doutrinária.
Em apertada síntese a Teoria da Ficção Jurídica, criada por Savigny explica a Pessoa Jurídica como um ente criado ficticiamente pela ordem jurídica, pois somente a pessoa humana teria personalidade.
Já a teoria da ficção doutrinária explica a pessoa jurídica como um fenômeno que adquire intelecto através da dos doutrinadores jurídicos e apenas por que existe a doutrina jurídica existe a pessoa jurídica.
Nos dizeres de GONÇALVES:
“Constrói-se, desse modo, uma ficção jurídica, uma abstração que, diversa da realidade, assim é considerada. Já a teoria da ficção doutrinaria explica a Pessoa Jurídica como um ente que não tem existência real e que por isso teria sua inteligência advinda da doutrina jurídica.” (2012, p.185).
Em contraponto às teorias da ficção surgiram as correntes da teoria da realidade. Para os adeptos desta corrente a pessoa jurídica não é uma mera ficção jurídica ou doutrinária, mas uma realidade verdadeira. Não se trata de algo abstrato, mas concreto.
Entre as teorias realistas podemos citar como mais importantes: Teoria da realidade objetiva ou orgânica; teoria da realidade jurídica ou institucionalista; e teoria da realidade técnica.
Pela teoria objetiva ou orgânica se explica a pessoa jurídica como um organismo vivo, possuindo uma realidade sociológica, e assim capaz de exercer sua própria vontade.
A teoria da realidade jurídica considera a pessoa jurídica como um entente jurídico criado pela força da lei através de suas relações sociais.
Por fim a teoria seguida pela melhor doutrina é a da realidade técnica. Por ela a pessoa jurídica é aquela a que lei atribui personalidade por reconhecer seus objetivos e vontades próprias. É o reconhecimento do Estado da necessidade de reconhecer e proteger as relações jurídicas de determinados grupos. Como lembra GONÇALVES, a personalidade jurídica é, portanto, um atributo que o Estado defere a certas entidades havidas como merecedoras dessa benesse por observarem determinados requisitos por ele estabelecidos (2012, p.186).
2. Autonomia patrimonial
A autonomia patrimonial, como diz Fábio Ulhôa (2014, p.65) é uma técnica de segregação de risco, assim como a afetação de bens e o condomínio por exemplo. Pela autonomia patrimonial, o patrimônio da sociedade (por ser personificada) é separado do patrimônio dos sócios - ou instituidor no caso da EIRELI (Empresa Individual de Responsabilidade Limitada) -.
Isto quer dizer que no que condizem as obrigações comerciais, o patrimônio da Pessoa Jurídica responde pelas obrigações contraídas por ela, não devendo o patrimônio pessoal do sócio ser atacado.
Neste sentido leciona Fábio Ulhôa Coelho:
“Pelo princípio da autonomia patrimonial, considera-se a sociedade empresária, por ser pessoa jurídica, um sujeito de direito diferente dos sócios que a compõem. Entre outras consequências, este princípio implica que a responsabilização pelas obrigações sociais cabe à sociedade, e não aos sócios. Apenas depois de executados os bens da sociedade, e mesmo assim observando-se eventuais limitações impostas por lei, os credores podem pretender a responsabilização dos sócios.” (2014, p.66)
Há hodiernamente excessiva relativização deste primordial princípio, sobretudo em regimes jurídicos como o consumerista e o trabalhista, por exemplo. Tal princípio é peça chave na atração de empreendedores na atividade empresária e deve ser seguido à risca, pelo menos, no dentro do regime de direito comercial (COELHO, 2014, p.66).
Vale ainda mencionar, em breve síntese por não se tratar de objeto do presente trabalho, a possibilidade de se afastar a autonomia patrimonial, caso este denominado de Teoria da Desconsideração da Personalidade jurídica. A aplicação de tal teoria suspende a autonomia patrimonial para atacar o patrimônio dos sócios nos casos de abuso da personalidade jurídica, isto é, quando a personalidade é utilizada com desvio de sua finalidade ou quando há confusão patrimonial entre a sociedade e seus sócios. Tal teoria está positivada em nosso ordenamento jurídico no art. 50 do CC/02, e ainda em outros dispositivos como o CDC (Código de Defesa do Consumidor).
3. Sociedades: simples e empresaria
Antes de adentrar no Registro das Sociedades é preciso distinguir uma Sociedade Empresaria de uma Sociedade Simples a fim de se identificar o adequado local de registro de seus atos constitutivos.
As sociedades empresarias definida em nosso ordenamento pelo Art. 966 do Código Civil de 2002 são aquelas, conforme explicita o próprio nome, que exercem atividades tidas como empresariais. Isto é, exercem profissionalmente atividade econômica organizada para a produção e circulação de bens e serviços. Como vemos na letra do referido artigo: “Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.”.
Destrinchando o art.966 do CC/02 podemos retirar requisitos essenciais para considerar uma Sociedade como empresária, como preleciona André Ramos[2], tais como: profissionalismo; atividade econômica; organizada; produção ou circulação de bens ou serviços. (2012, p.37)
Por profissionalismo podemos entender que desta atividade o Empresário atua com habitualidade, fazendo desta sua atividade principal.
Por atividade econômica extraímos que da atividade empresaria se baseia no lucro como finalidade precípua a ser alcançada pela sociedade, ainda que não o obtenha, é o denominado pela doutrina pelo termo em latim como animus lucrandi[3].
Por atividade organizada compreende-se que no exercício de atuação a sociedade articula os fatores de produção tais como: Capital, trabalho, insumos e tecnologia.
Por fim a produção ou circulação de bens ou serviço se dá com a criação de bens ou intermediação em sua circulação. Deixando claro que todas as atividades desde que estejam dentro dos requisitos anteriores serão enquadradas como atividade empresária.
Apesar de também ter intuito lucrativo, a sociedade tida como simples distingue-se da empresaria. Exerce sua atividade atuando de maneira Uniprofissional[4] (como uma sociedade de médicos ou de contadores, por exemplo) e não articula os fatores de produção.
As sociedades simples exercem atividades de natureza intelectual e não econômica, sejam científicas, literárias ou artísticas, conforme norma do Parágrafo Único do Art.966 do nosso Código Civil, como vemos: “Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.”.
Vale lembrar que a norma supracitada ao fim revela uma exceção. Caso a sociedade, ainda que exerça atividade tida como simples, se valha na sua atuação da articulação dos fatores de produção, será ela considerada empresaria. É o que se entende na doutrina pelo termo elemento de empresa. Como vemos:
“(...) nos casos em que o exercício da profissão intelectual dos sócios das sociedades uniprofissionais (que constituem o seu objeto social) constituir elemento de empresa, ou seja, nos casos em que as sociedades uniprofissionais explorarem seu objeto social com empresarialidade (organização dos fatores de produção),elas serão consideradas empresárias.” (RAMOS, 2012, p.212)
Neste sentido, vale transcreve o enunciado nº 195 aprovado na III Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal (As Jornadas de Direito Civil são realizadas pelo Conselho da Justiça Federal - JF e o Centro de Estudos Jurídicos do CJF. Compostas por especialistas e convidados de notório saber jurídico. São elaborados enunciados de Direito Civil, baseados no Código Civil de 2002 e que buscam uma melhor interpretação de seus dispositivos). Vejamos:
“195 – Art. 966: A expressão “elemento de empresa” demanda interpretação econômica, devendo ser analisada sob a égide da absorção da atividade intelectual, de natureza científica, literária ou artística, como um dos fatores da organização empresarial.”.
Vale lembrar ainda sobre o assunto que por disposição do código civil, não importando a natureza da atividade prestada, se simples ou empresaria a sociedade cooperativa será sempre sociedade simples e a Sociedade Anônima será sempre Empresária. É o que dispõe a norma do art. 982, parágrafo único do CC/02 como se vê:
“Art. 982. Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro (art. 967); e, simples, as demais.”
“Parágrafo único. Independentemente de seu objeto, considera-se empresária a sociedade por ações; e, simples, a cooperativa.”
Com base nos arts. 18 da Lei 5.764/71 e do art. 32, II, “a” da Lei 8934/94, as Sociedades Cooperativas, ainda que sempre simples, são registradas nas Juntas Comerciais. Neste sentido foi editado o Enunciado 69 do CJF. Vejamos: “69 – Art. 1.093: as sociedades cooperativas são sociedades simples sujeitas à inscrição nas juntas comerciais.”.
O fato do registro das sociedades cooperativas serem ainda feitos na Junta Comercial é que as normas supracitadas assim dispõem, e por serem consideradas normas especiais, consideram-se válidas ainda que o CC/02 diga que se trata de uma sociedade simples por força de lei, pois este se considera uma lei geral e pelo critério da especialidade da solução de conflitos entre as normas se manteve o registro na Junta Comercial.
Fato este que encontra polêmicas na doutrina. Autores do quilate de Fábio Ulhôa Coelho (2013, p. 493) sustentam que o art. 18 da Lei 5.764/71 não foi recepcionado pela CF/88 e, portanto o art. 32, II “a” da Lei 8.934/94 teria sido revogado pelo art. 1.150 do CC/02, havendo, portanto a partir de então um novo sistema de registro:
“Art. 1.150. O empresário e a sociedade empresária vinculam-se ao Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais, e a sociedade simples ao Registro Civil das Pessoas Jurídicas, o qual deverá obedecer às normas fixadas para aquele registro, se a sociedade simples adotar um dos tipos de sociedade empresária”.
Na mesma linha André Ramos (2013, p.55) sustenta que as Cooperativas por se tratarem de atividade simples deveriam ser registradas no Registro Civil de Pessoas Jurídicas e não na Junta comercial.
Em sentido contrário Maria Helena Diniz (2013, p.289) afirma que os artigos supracitados sobre o tema foram recepcionados e prevalecem sobre o Código Civil. Devendo as cooperativas serem registradas na Junta Comercial conforme aduz o enunciado nº 69 do CJF.
A polêmica doutrinária poderá chegar ao fim com a promulgação do possível novo código comercial que tramita no Congresso Nacional (Projeto de Lei nº 1.572, de 2011) e prevê que o registro das sociedades se fará sempre na Junta Comercial, independente da natureza da atividade se empresaria ou simples.
4. Registro da sociedade empresaria
Definido o tipo de Sociedade a ser criada, se Simples ou Empresaria, seus atos constitutivos devem ser levados a registro. A Sociedade Empresaria, Assim como o Empresário Individual e a EIRELI devem ser Registrada na Junta Comercial. Enquanto a sociedade simples será registrada no Registro Civil de Pessoas Jurídicas (RCPJ).
O Registro Público de Empresas Mercantis é fundado sob o Sistema Nacional de Registro de Empresas (SINREM) que tem sua norma legal expressa na Lei nº8934/94, não obstante também encontramos normas sobre registro de empresários com base legal no Código Civil de 2002.
O SINREM é Composto pelo DREI (Departamento de Registro Empresarial e Integração) e pelas Juntas Comerciais.
O DREI é órgão de cúpula do sistema, vinculado à Secretaria da Presidência da República, instituído pelo Decreto nº 8.001, de 10.05.2013, que veio substituir o antigo DNRC (Departamento Nacional de Registro de Comercial) que era vinculado ao Ministério da Indústria e Comércio. Possui Competência supervisora, orientadora, coordenadora e normativa no âmbito técnico, podendo inclusive editar Instruções Normativas sobre Registro Público de Empresas Mercantis, e supletiva no âmbito administrativo.
As Juntas Comerciais por sua vez são entidades estaduais e possuem natureza jurídica conforme o estado que compõe, podendo ser, por exemplo, uma autarquia estadual ou apenas órgão público despersonalizado. Estão vinculadas tecnicamente ao DREI e administrativamente ao estado ao qual fazem parte. Possuindo, portanto uma natureza hierárquica híbrida. Excepcionalmente a Junta Comercial do DF se submete tanto técnica quanto administrativamente ao DREI.
Em razão dessa competência híbrida é pacífico no entendimento do STJ (Superior Tribunal de Justiça) que a competência para apreciar decisões judiciais em que é parte a Junta Comercial também será dual. Em tese o STJ vinha entendendo que quando se tratasse de ações com base em questões administrativas esta de competência é da Justiça Estadual. Quando se tratasse de ações que com base questões técnicas, estas seriam de competência da justiça federal. Contudo André Ramos (2013, p.67) lembra que está competência foi ligeiramente alterada pela corte, passando a competência da justiça federal apenas para questões em que se discute a lisura dos atos praticados pela Junta Comercial e para julgamento de Mandado de Segurança impetrado contra seu presidente. Como vemos no jugado abaixo:
“Recurso especial. Litígio entre sócios. Anulação de registro perante a junta comercial. Contrato social. Interesse da administração federal. Inexistência. Ação de procedimento ordinário. Competência da justiça estadual. Precedentes da segunda seção. 1. A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça tem decidido pela competência da Justiça Federal, nos processos em que figuram como parte a Junta Comercial do Estado, somente nos casos em que se discute a lisura do ato praticado pelo órgão, bem como nos mandados de segurança impetrados contra seu presidente, por aplicação do artigo 109, VIII, da Constituição Federal, em razão de sua atuação delegada. 2. Em casos em que particulares litigam acerca de registros de alterações societárias perante a Junta Comercial, esta Corte vem reconhecendo a competência da justiça comum estadual, posto que uma eventual decisão judicial de anulação dos registros societários, almejada pelos sócios litigantes, produziria apenas efeitos secundários para a Junta Comercial do Estado, fato que obviamente não revela questão afeta à validade do ato administrativo e que, portanto, afastaria o interesse da Administração e, consequentemente, a competência da Justiça Federal para julgamento da causa. Precedentes. Recurso especial não conhecido (REsp 678.405/RJ, 3.ª Turma, Rel. Min. Castro Filho, j. 16.03.2006, DJ 10.04.2006, p. 179).”
O Registro da Sociedade empresária deve ser efetuado na Junta Comercial. É uma obrigação imposta pelo ordenamento jurídico que o registro se dê antes do início das atividades para que a Sociedade seja considerada regular como informa o art.967 do Código Civil, contudo, em situação excepcional, se este registro se der até 30 dias da assinatura do ato constitutivo este registro retroagirá a data desta assinatura, operando efeito ex tunc, desta forma considera-se a sociedade regular desde a assinatura do ato constitutivo.
Caso diverso é quando a assinatura dos atos levados à registro se dá após 30 dias de assinados, neste caso o efeito do registro opera efeitos ex nunc, e o registro é feito na data do arquivamento do seu ato constitutivo na Junta Comercial. É o que assevera o art.36 da Lei nº8. 934/94.
O registro na Junta Comercial possui as seguintes finalidades, elencadas pelo art.1º da Lei nº8. 934/94: “I - dar garantia, publicidade, autenticidade, segurança e eficácia aos atos jurídicos das empresas mercantis, submetidos a registro na forma desta lei; II - cadastrar as empresas nacionais e estrangeiras em funcionamento no País e manter atualizadas as informações pertinentes; III - proceder à matrícula dos agentes auxiliares do comércio, bem como ao seu cancelamento.”
É o registro o meio pelo qual se opera a constituição da Pessoa Jurídica, é a partir deste ato que a sociedade ganha personalidade, sendo este o principal efeito. Contudo não é o registro o ato constitutivo de ser empresário, sendo este apenas requisito de regularidade, haja vista que se considera como empresário quem pratica atividade tida como empresária nos moldes do art.966 do CC/02, ainda que de forma irregular. Neste sentido vale mencionar o enunciado 198 do CJF:
“198 – Art. 967: A inscrição do empresário na Junta Comercial não é requisito para a sua caracterização, admitindo-se o exercício da empresa sem tal providência. O empresário irregular reúne os requisitos do art. 966, sujeitando-se às normas do Código Civil e da legislação comercial, salvo naquilo em que forem incompatíveis com a sua condição ou diante de expressa disposição em contrário.”
A exceção à regra é a do Empresário Rural que por faculdade legal prevista no art.971 do CC/02 só será empresário quando optar pelo registro na Junta Comercial. Neste caso o efeito deste registro é constitutivo e não mera regularidade, pois não há que se falar em empresário rural irregular por não possuir registro já que a só o será se registrar-se na Junta Comercial. Tal exceção foi objeto do enunciado 202 CJF. Vejamos:
“202 – Arts. 971 e 984: O registro do empresário ou sociedade rural na Junta Comercial é facultativo e de natureza constitutiva, sujeitando-o ao regime jurídico empresarial. É inaplicável esse regime ao empresário ou sociedade rural que não exercer tal opção.”
5. Registro das sociedades simples
Assim, como no registro das sociedades empresárias, o Registro das sociedades simples possuem as mesmas finalidades embora seu sistema registral seja mais simples.
As sociedades simples devem realizar o registro de seus atos constitutivos no Registro Civil de Pessoas Jurídicas (RCPJ) conforme ordena o art.998 do CC/02. Seu procedimento é regido pelo Código Civil e principalmente pela a Lei nº 6.015/73 (Lei de Registros Públicos).
O RCPJ é registro de uma serventia notarial, comumente conhecida como Cartório Extrajudicial, exercida por particular por meio de Delegação através de concurso público, conforme art.14 da Lei nº 8.935/94. E desta forma possui subordinação ao poder judiciário estadual que é responsável por sua correição.
Semelhante ao registro das sociedades empresárias possui o prazo de 30 dias para o registro dos seus atos constitutivos como vemos na norma do artigo 998 do CC/02: “Nos trinta dias subsequentes à sua constituição, a sociedade deverá requerer a inscrição do contrato social no Registro Civil das Pessoas Jurídicas do local de sua sede.”. Através deste registro se adquire personalidade jurídica, podendo então a sociedade titularizar direitos e contrair obrigações angariando seu próprio patrimônio.
Por fim a finalidade do registro é encontrada no art.1º da Lei nº 6.015/73 como vemos: “Art. 1º Os serviços concernentes aos Registros Públicos, estabelecidos pela legislação civil para autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos, ficam sujeitos ao regime estabelecido nesta Lei.”
6. Ausência de registro
A ausência do registro torna a sociedade irregular. Isto porque, como já vimos, é obrigação, tanto do empresário quanto do que exerce atividade simples, arquivar seus atos constitutivos no local adequado.
A irregularidade por sua vez torna o sujeito ilimitadamente responsável pelas obrigações contraídas pela sociedade irregular. O sócio que contrata pela sociedade é ilimitadamente e diretamente responsável e os demais sócios respondem ilimitadamente, porém subsidiariamente (CC, art. 990) – caso a sociedade que se queria constituir fosse anônima a responsabilidade é direta, ilimitada e solidária (COELHO, 2014, p.108) –, obviamente porque o registro é o ato constitutivo da sociedade e sem sociedade evidentemente não há personalidade jurídica não ocorrendo, portanto, a separação patrimonial.
Além do mais o empresário irregular terá outras sanções, fiscais, administrativas e as trazidas pela Lei de Falências (Lei nº11. 101/05), não podendo pedir falência nem recuperação judicial.
7. Registro em local inadequado
Situação um pouco diferente da falta de registro é a ocorrência do registro feito em local diverso do adequado. De forma que tal sociedade deveria ser registrada na Junta Comercial por ser evidente que se trata de uma atividade empresaria, mas foi registrada no RCPJ, ou vice-versa.
Se o registro equivocado for de flagrante situação adversa ou feito na tentativa de fraude a ocorrência ensejará a irregularidade da sociedade. Contudo é, muitas vezes, difícil precisar em alguns casos se tal atividade se trata ou não de atividade empresarial, isto porque muitas vezes há uma área cinzenta entre a atividade simples e a atividade empresária, neste caso a situação não será de irregularidade da sociedade.
Nas palavras de Tavares Borba (2012, p.25) entendemos a situação:
“A irregularidade estaria na falta de inscrição, não na inscrição inadequada, tanto que a finalidade do registro, que é a publicidade e a fiscalização do cumprimento dos preceitos legais aplicáveis, estaria de qualquer sorte, assegurada. A irregularidade (registro impróprio) ocorreria apenas quando a inadequação do registro fosse manifesta, ou quando houvesse evidente intuito de fraudar a lei. Nesses casos, o registro poderia ser desconstituído, ou ter seus efeitos afastados, por decisão judicial.”
Assim, comumente as Juntas Comerciais e o próprio RCPJ, nos casos de situações que não são fáceis de precisar a natureza da atividade, registram as sociedades que lhes são competentes conforme a declaração dos sócios que lhes levam os atos para arquivamento.
Conclusão
Após o exposto vislumbramos que nem sempre é fácil distinguir se a atividade que se pretende praticar é empresaria ou se trata de uma atividade simples o que gera um problema na hora de registrar tal sociedade. Isto porque com a dinâmica do mundo dos negócios que se tem nos dias de hoje é muito comum o incremento das atividades, ainda que “uniprofissionais”.
Ainda que a sociedade, na prática, seja registrada conforme declaração pessoal dos sócios, e que muitas vezes a atividade se encontre em uma “zona cinzenta”, o incremento e crescimento dessas atividades no mercado acabam gerando a absorção da atividade simples pelos fatores de produção (capital, mão-de-obra, insumos e tecnologia), tornando a atividade simples em atividade empresaria. Tal fato enseja a necessária baixa do RCPJ para que se registrem os atos na Junta Comercial, evitando futuros dissabores e o risco de ter a sociedade decretada como irregular.
Faz-se necessário e prudente, portanto a consulta de um advogado especializado em direito comercial para dirimir eventuais dúvidas a respeito deste registro e da natureza da atividade praticada. Afinal, nunca se sabe o que se pode de fato enfrentar em uma eventual ação judicial.
Referências
Para a elaboração do presente trabalho, foram consultadas as seguintes obras:
AGUIAR Jr., Ruy Rosado de (Org.). In: JORNADA DE DIREITO CIVIL, 4., 2007. Brasília: CJF, 2007, Disponível em:http://www.cjf.jus.br/enunciados/pesquisa/resultado Acesso em 14 de outubro de 2014.
BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. 13. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2012.
BORGES, João Eunápio. Curso de direito comercial terrestre. 5. ed. Rio de Janeiro : Forense, 1991.
COELHO, Fábio Ulhôa. Manual de Direito Comercial.v.1. 18.ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, vol. 8, Direito de Empresa, 5ªed., São Paulo: Saraiva, 2013.
FIUZA,César. Direito civil. 15.ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2012.
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MACHADO NETO, Antônio Luiz. Sociologia jurídica. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 1987.
PEREIRA Caio Mario da Silva. Instituições de direito civil. 24.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011.
RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito empresarial esquematizado. 4.ed. Rio de Janeiro: Método; 2012.
Notas
[1] MACHADO NETO, Antônio Luiz. Sociologia jurídica. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 1987.
[2] RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito empresarial esquematizado. 2º ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2012. p, 37.
[3] BORGES, João Eunápio. Curso de direito comercial terrestre. 5. ed. 4. tiragem, Rio de Janeiro : Forense, 1991.
[4] RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Op., cit., p.212.