CRIMES CIBERNÉTICOS NAS REDES SOCIAIS: FACEBOOK INC.


04/04/2019 às 14h44
Por Andreza Loverly Advocacia

          É de fato notório que o desenvolvimento da internet passou a acompanhar a evolução da sociedade, sendo que em alguns casos podemos dizer que até mesmo a ultrapassou. O uso das novas tecnologias beneficiam a vários setores econômicos, sociais e culturais, além de aproximar os usuários que se conectam de diferentes regiões podendo compartilhar informações e interagir com absoluta rapidez e eficiência.

          Com o avanço da internet e o desenvolvimento de novas tecnologias, atualmente vivemos em uma era de mídias sociais que, de acordo com o conceito de Luiz Mauro Sa Martino[1] “podem ser entendidas como um tipo de relação entre seres humanos pautada pela flexibilidade de sua estrutura e pela dinâmica entre seus participantes”. Entre outras palavras, as redes sociais são caracterizadas pela inteiração de usuários de diversas classes sociais, econômicas e culturais, que possuem entre si diversos núcleos de profundidade de relações.

           Martino[2] também nos ensina que “ao contrário de outros agrupamentos humanos, nos quais existem vínculos duradouros, fundamentados em valores mais ou menos compartilhados, nas redes não existe necessariamente a obrigação de ter um ritmo específico de atividades, assim como não se exigem ligações exclusivas”.

           Nos remetendo a questão de que nas redes sociais as conexões são estabelecidas e esquecidas, ou até mesmo excluídas, sem maiores esclarecimentos ou necessidade de motivos que justifiquem sua conexão ou exclusão.

            Em que se pese o desenvolvimento da humanidade há, necessariamente, ocorrendo em paralelo a evolução do Direito. Com o advento da internet e o uso irrestrito de redes sociais há cada vez mais ocorrências de crimes envolvidos neste espaço virtual. Páginas e aplicativos desenvolvidos para interação entre pessoas estão sendo cada vez mais utilizados para o cometimento de crimes. Os usuários se utilizam da falsa sensação de anonimato para infringir a legislação. Ocorreu no meio jurídico a necessidade de adequar as normas jurídicas já existentes para tipificar os crimes ocorridos nas redes.

            Dentre as infrações penais cometidas, as mais comuns, são os crimes de Calúnia, Difamação e Injúria, crimes contra a honra tipificados, respectivamente, nos artigos 138, 139 e 140 do Código Penal Brasileiro (CP), em que o agente ofende a honra subjetiva (injúria) e objetiva[3] (calúnia e difamação) do indivíduo em ambiente virtual. Pode-se verificar também a ocorrência do delito de Falsa Identidade, artigo 307 do mesmo preceito legal, aos usuários que registram nas redes perfis de outras pessoas como sendo próprios, atribuindo a si ou a terceiro falsa identidade para benefício próprio ou alheio, para causar dano a outrem.

            Em 24 de Setembro de 2018, foi publicada a Lei nº 13.718[4], que introduziu no ordenamento jurídico, o artigo 218-C no CP o crime de Divulgação de cena de estupro ou cena de estupro de vulnerável, de cena de sexo ou pornografia. Neste referido tipo penal há o delito de se disponibilizar, distribuir, publicar ou divulgar, entre outras ações, cenas de pornografia ou nudez sem o consentimento da vítima, os chamados “Revanche Pornô”, ocasião em que um dos parceiros após o término do relacionamento divulga indevidamente vídeos de prática sexual ou fotos íntimas do outro.

             Antes da alteração no Código Penal o agente que divulgava vídeos ou fotografias indevidamente na internet através das redes sociais ou o disponibilizava em alguma  plataforma digital estaria tipificado no delito de Difamação, com pena de detenção de 3 meses a 1 ano, além da multa.

             Doravante, após a mudança houve a inclusão de um novo tipo penal incriminador, o delito se tipifica no artigo 218-C, com penalidade de reclusão de 1 a 5 anos, se o fato não constituir crime mais gravoso. Neste caso pode-se visualizar que houve a necessidade de adequação legislativa para uma pratica recorrente de um crime cibernético, não previsto no ordenamento jurídico, de relevante apelo social e moral carecendo de tipificação específica com penalidade apropriada.

             A rede social Facebook Inc, lançada em 2004, pelo fundador e CEO Mark Zuckerberg[5] é a plataforma mais utilizada no mundo, sendo que em Julho do ano de 2.018, o jornal online Folha de São Paulo[6] publicou uma matéria com a estimativa de que a rede social chega a 127 milhões de usuários mensais no Brasil. Com o uso excessivo da plataforma e a quantidade de ocorrências envolvendo os usuários se fez necessário que se adequassem para fornecer as informações que possibilitem uma investigação efetiva, em caso de ocorrência de um delito na rede. Se mostra salutar esclarecer que a empresa Facebook Inc. adquiriu em 2012 a interface da rede social Instagram [7],[8], respondendo desde então solidariamente pela rede, tanto em questões civis quanto criminais.

             Por conta da quantidade de solicitações advindas de autoridades policiais e determinações judiciais de várias partes do globo, visto a empresa disponibilizar o aplicativo e rede social a diversos países, houve a necesidade da criação de uma plataforma que possibilitasse um acesso célere e eficiente para suprir a constância de encaminhamento de envio e respostas das demandas solicitadas, ocorrendo o surgimento da plataforma Facebook Records[9]. A plataforma, criada pela própria empresa, permite o acesso a autoridades policiais, judiciais e ao Ministério Público – através de prévio cadastro individual - funcionalidades que agilizam a tramitação das demandas, facilitando o acesso, dispondo as autoridades de utilidades como Preservação de um perfil, sem a necessidade de prévia oficialização do pedido e posteriormente a Solicitação de Dados, mediante determinação judicial.

             O usuário vítima de crimes na rede social Facebook Inc. para o registro de ocorrência deve possuir as postagem em que ocorreu o ilícito, sendo ofensas, histórias inverídicas relacionadas a sua pessoa ou a divulgação indevida de sua imagem, além da reprodução da tela (print) contendo o perfil do usuário que efetuou a publicação, onde deve constar, obrigatoriamente, o endereço eletrônico do perfil (URL)[10], por meio do qual haverá a solicitação de preservação dos dados do usuário através da plataforma Facebook Records. A omissão das informações acima mencionadas impossibilita que o usuário seja identificado, e consequentemente, devidamente punido judicialmente pelos seus atos, tanto nas esferas civis e penais.

             Como a utilização da rede social é feita em sua maioria através do aplicativo oficial da rede, disponível na Play Store (sistema Android) e Apple Story (sistema IOS), ao visitar a página do usuário o endereço eletrônico utilizado não pode ser visualizado, sendo necessário que a vítima acesse o campo “Mais” e selecione a opção “Copiar link do perfil”, onde o endereço eletrônico ficará disponível na área de transferência do aparelho e aparecerá quando realizar o comando “Copiar” em um aplicativo de notas, por exemplo. Ademais, a maneira mais fácil de se obter o endereço eletrônico do perfil seria utilizando um navegador, onde ao acessar o perfil desejado o URL deste estará disponível na barra de endereço.

             Alguns usuários ao se depararem vítimas de crimes na rede social em primeiro momento denunciam a publicação ou até mesmo o referido perfil a administração do Facebook Inc., ocasionando a exclusão do perfil, por conseguinte a postagem ofensiva, antes da elaboração do Boletim de Ocorrência para devida apuração da infração. É primordial ao usuário vítima da infração que detenha as provas relativas ao crime antes que ocorra a exclusão do perfil.

             Após o registro da ocorrência a autoridade policial solicitará a rede social, através do Facebook Records a preservação do perfil e oficiará ao Poder Judiciário, encaminhando o registro da ocorrência e as provas fornecidas pela vítima, solicitando a Quebra de Sigilo telemática[11]. É imperativo salientar que a necessidade do endereço eletrônico do perfil se faz necessária por ocasião da individualização do usuário na rede social.

            Com a vigência do Marco Civil da Internet – Lei nº 12.965, de 23 de Abril de 2014, que disciplina a utilização das redes de internet no Brasil, se tratando da proteção aos registros, dados pessoais e comunicações privadas, em seu artigo 11, estabelece que o acesso as aplicações de internet devem atender a preservação da intimidade, honra e imagem das partes, e na ocasião da disponibilização de dados, o parágrafo 2º do mesmo artigo legal, prevê que somente será disponibilizado mediante ordem judicial, visto que o acesso a essas informações caracteriza a macula de princípios legais, previstos na Constituição Federal, artigo 5º, inciso XII, que disciplina que a violação das comunicações telefônicas (telemáticas) somente poderá ocorrer por ordem judicial, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.

            Os registros de acesso e demais dados cadastrais armazenados pela empresa tem por previsão legal a guarda e manutenção de registro pelo período mínimo de 06 meses, artigo 15, do Marco Civil. Ocorre que na prática, por conta de inúmeros fatores, a empresa concede a manutenção desses dados por um período mais abrangente, proporcionando mais efetividade nas investigações.

              Com o envio da determinação judicial, igualmente através da plataforma Facebook Records, solicitando os dados do usuário, a empresa informará os dados que dispõe, sendo: os registros de Ip Adress com datas e horários de acesso, o Ip Adress utilizado para criação do perfil e, em alguns casos, a linha telefônica vinculada. A partir dessas informações far-se-á pesquisa a página Whois [12] para vislumbrar a empresa fornecedora da rede de internet e a página ABR Telecom [13] da linha de telefone vinculada. Evidenciado as empresas fornecedoras da rede de internet e da linha telefônica, estas serão oficiadas para informar os dados cadastrais do usuário, contendo nome completo, documento de identidade ou CPF e endereço.

             A autoridade policial possui legitimidade para solicitar as empresas de telefonia os dados cadastrais de usuários, sendo prescindível determinação judicial neste sentido. Essa legitimidade possui previsão na Lei nº 12.830, de 20 de Junho de 2013, que dispõe sobre a Investigação Criminal conduzida pelo Delegado de Polícia. A legislação prevê em seu artigo 2º, parágrafo 2º, que solicitações de documentos e dados que interessem a apuração dos fatos, podem ser solicitados pela autoridade policial, pois as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais são essenciais e de competência exclusiva do Estado. Sua fundamentação esta caracterizada pela não violação das comunicações telefônicas e sim meras referências cadastrais fornecidos pelo próprio usuário a empresa de telefonia.

           Diante dos fatos, pode-se vislumbrar que atualmente, apesar do senso comum em contrário, é plenamente possível a identificação da autoria nos crimes Cibernéticos, utilizando ferramentas apropriadas com o auxílio das próprias mídias sociais. Sendo que ao final do procedimento administrativo, os autos são remetidos ao Poder Judiciário e se tem início a Ação Penal, resguardando a peculiaridade de cada caso.

 

[1] MARTINO, Luís Mauro Sá. Teoria das mídias sociais - linguagens, ambientes e rede. pg. 55. 2ª Edição. Rio de Janeiro, Editora Vozes, 2015.

[2] Ibid., p. 56.

[3] Doutrina Capez.

[4] Legislação que alterou o Código Penal. Fonte: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2018/Lei/L13718.htm.

[5] TEIXEIRA, Carlos Alberto. A Origem do Facebook. Jornal O Globo. Edição Online. Fonte: https://oglobo.globo.com/sociedade/tecnologia/a-origem-do-facebook-4934191. Acesso em: 17/10/2018.

[6] https://www1.folha.uol.com.br/tec/2018/07/facebook-chega-a-127-milhoes-de-usuarios-mensais-no-brasil.shtml

[7] http://g1.globo.com/tecnologia/noticia/2012/04/facebook-anuncia-compra-do-instagram.html

[8]Instagram é uma rede social online para compartilhamento de fotografias e vídeos entre os usuários. A rede social se tornou bastante popular após aquisição pela empresa Facebook Inc., sendo que muitos usuários utilizam a rede para se sentirem mais próximos de grandes personalidades que compartilham em uma das funcionalidades do aplicativo momentos de sua vida.

[9] Mais informações quanto ao uso da plataforma pode ser acessado em: https://www.facebook.com/safety/groups/law/guidelines.

[10] Sigla em inglês para Uniform Resource Locator,é o endereço eletrônico disponível em uma rede, popularmente conhecido como endereço virtual. A URL é composta de um protocolo de comunicação que permite a transferência de arquivos na internet. Exemplo: https://www.facebook.com .

[11] Telemática é uma comunicação a distância de um ou mais conjuntos de serviços informáticos fornecidos através de uma rede de telecomunicações.

[12]  A página de pesquisa de registro de IP’s pode ser acessada pelo link: https://registro.br/2/whois.

[13] A página de pesquisa de operadoras de linhas telefônicas pode ser acessado através do link: http://consultanumero.abrtelecom.com.br/consultanumero/consulta/consultaSituacaoAtualCtg.

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Referências

Andreza Loverly Silva de Aquino, Bacharelanda em Direito pela Universidade Paulista – UNIP, campus de Assis/SP, Estagiária de Direito na Delegacia de Defesa da Mulher – DDM de Ourinhos/SP.


Andreza Loverly Advocacia

Advogado - Ourinhos, SP


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